Ilha de Santa Helena, Oceano Atlântico, 1818.
Napoleão Bonaparte, exilado e doente, relembra os fatos importantes de sua vida.
Voltando no tempo em suas lembranças, ele retorna a 1795, quando conhece Josefina de Beauharnais, que viria a ser sua primeira esposa e grande amor de sua vida.
Tudo o que lhe aconteceu a partir desse momento, até a sua morte no exílio, está deliciosamente contado na série para TV chamada Napoleão, do diretor Yves Simoneau, de 2002.
Essa série contém 4 episódios de uma hora e meia cada um, aproximadamente. Portanto são quase 6 horas de história sobre Napoleão que passam voando. Eu realmente me apaixonei e fiquei triste quando acabou.
Por estar no formato de série para TV, a obra é bem mais "palatável" e fácil de entender. O que não tira o seu valor, principalmente pelo fato de ter mais tempo para explorar melhor as passagens da vida de Napoleão.
O elenco conta com a linda atriz francesa Isabella Rossellini no papel de Josefina, além de Gérard Depardieu como o girondino Joseph Fouché, Ministro da Polícia, e John Malkovich como Charles Talleyrand, Ministro das Relações Exteriores.
Em 1793 Napoleão tinha saído vitorioso e aclamado na batalha que ficou conhecida como Cerco de
Toulon, em que expulsou os ingleses que estavam ajudando os monarquistas a retomar o poder após a Revolução Francesa.
Em 1795, após conhecer Josefina, com quem logo começou um flerte correspondido, Napoleão conhece também o então deputado Paul Barras, que, já sabendo da reputação de Napoleão após o episódio de Toulon, atribui a ele algumas reponsabilidades militares, suficientes para que o jovem logo ganhasse ainda mais destaque.
Em 1796, após mais uma vitória contra os monarquistas que lhe rendeu fama e riqueza, ele se casou com Josefina. Napoleão contou também com a ajuda de um jovem oficial da Cavalaria, Joachim Murat, que viria a se casar com uma de suas irmãs.
Desde 1792 vigorava
na França o Calendário Revolucionário Francês, ou Calendário
Republicano, criado por Robespierre durante a
Revolução Francesa, para se opor ao Calendário Gregoriano, rompendo assim
ainda mais com qualquer tipo de religião. Somente em 1804 Napoleão viria a
decretar a volta do Calendário Gregoriano.
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Napoleão - Uma Vida
Complementando o conhecimento obtido com o filme, podemos falar um pouco mais sobre a biografia de Napoleão Bonaparte com as ricas informações do livro Napoleão - Uma Vida, do autor galês Vincent Cronin.
Infância na Córsega
Napoleão nasceu em 15 de agosto de 1769, em Ajaccio, capital da Córsega, uma ilha na região da Itália que havia se tornado uma região administrativa da França poucos meses antes de seu nascimento, quando foi vendida pelos genoveses para o rei Luís XV, em maio de 1768.
O segundo dos oito filhos do jovem casal Carlo Bonaparte e Maria Letícia (5 meninos e 3 meninas), descendentes da nobreza italiana. Seu pai era advogado e prestava serviços ao rei Luís XVI, da França. Sua família vivia com um certo conforto mas não era rica. Ele teve uma infância feliz e absorveu muitos dos valores típicos de seu país, como o senso de independência e uma certa presunção. Particularmente Napoleão tinha também um forte senso de justiça e de liderança.
Academia Militar de Brienne
Preocupado com o futuro dos filhos, Carlo conseguiu bolsas de estudo para os mais velhos, e, em dezembro de 1778, aos nove anos de idade, Napoleão seguiu com o pai para Marselha na França, e logo em seguida, em maio de 1779 mudou-se definitivamente para a pequena cidade francesa de Brienne, situada na parte verde de Champagne, onde ficaria internado para estudar na academia militar, administrada por monges franciscanos.
Academia Militar de Brienne
Lá ele teve uma vida muito dura e difícil, longe da família que tanto amava, sem falar muito bem o francês e sendo debochado pelos colegas por seu sotaque corso e também por ser um bolsista, já que a escola era destinada aos nobres franceses de famílias ricas. Como um corso típico, Napoleão detestava ser zombado.
Na escola era muito bom em matemática, história e geografia. Tinha gosto pela leitura e também por escrever, e, como ele mesmo escreveu, tinha "uma inclinação definitiva para o serviço militar" e um desejo de entrar para a Marinha.
École Militaire de Paris
Em outubro de 1784, aos 15 anos, Napoleão mudou-se para Paris, para estudar na Escola Militar, ficando completamente embasbacado ao chegar, com a opulência da cidade. Sua vida melhorou bastante e ele se sentia muito mais motivado.
École Militaire de Paris
No ano seguinte, como não houve seleção para a Marinha, ele foi encarregado da artilharia, recebendo sua patente assinada por Luís XVI.
Com a morte de seu pai, Napoleão passou a ser o único provedor da família, com seu parco salário de oficial, ou seja, as coisas não seriam nada fáceis para ele nesse começo da carreira militar.
Revolução Francesa
Em 1786, ao assumir suas funções como segundo-tenente, e optou por servir em um regimento na cidade guarnição de Valença, na região Ródano-Alpes, para ficar mais perto de sua família na Córsega.
Nessa época ele já começava a testemunhar a penúria vivida pelos civis, e as primeiras revoltas do Terceiro Estado (a Plebe - o Primeiro Estado era a Nobreza e o Segundo Estado era o Clero) que iriam desencadear a revolução alguns anos depois. Napoleão, apesar de pertencer à nobreza, era solidário ao sofrimento e à fome da população, mas achava que tudo teria que ser resolvido dentro da ordem e não com revoltas.
Nesse período também a Córsega passava por dificuldades. O domínio francês, que até então era benéfico para a região, tornou-se opressor e injusto.
Além disso, a Europa em geral passava por transformações com o sucesso das reformas promovidas pelos déspotas esclarecidos, em monarquias como Espanha, Portugal, Suécia e Áustria.
Em 1789, em Paris, após a tomada da Bastilha pela população enfurecida contra a monarquia, os Estados-Gerais formaram a Assembleia Constituinte, que apresentou à França a sua primeira Constituição, que começava com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.
Em Valença Napoleão foi um dos primeiros a entrar para a Sociedade dos Amigos da Constituição, e, em 1791 ele fez um juramento de nunca deixar uma nação estrangeira invadir o solo francês. Tinha esperanças de que todos esses movimentos também fossem benéficos para a Córsega.
Nesse mesmo ano Napoleão tirou uma licença e foi para Ajaccio, para a casa de sua mãe. Lá ele se envolveu em revoltas contra o governo local com intenção de melhorar a situação da ilha, mas sua tentativa foi um verdadeiro fracasso.
Em 1793 ele e sua família tiveram que fugir da Córsega para a França, deixando para trás todos os seus pertences. Eles seguiram como refugiados para Toulon e posteriormente se instalaram em Marselha.
A França então já estava vivendo a fase do Terror, promovido pelo governo que agora era formado pelo Comitê da Segurança Pública, criado pela Convenção, formado por advogados de classe média liderados por Maximilien Robespierre.
Cerco de Toulon
Ainda em 1793, as cidades do interior da França já estavam dando demonstrações de revolta contra o governo, principalmente por causa do terror instaurado, dos altos preços dos alimentos e também por causa da profanação aos símbolos religiosos, devido à descristianização promovida pelo Comitê.
As nações vizinhas, encabeçadas pela Inglaterra, pretendiam promover a volta da monarquia, colocando no trono o rei Luís XVIII, da casa dos Bourbon. Esses aliados do rei encontraram na cidade de Toulon, no sul da França, território propício para fazer essa investida.
Napoleão foi designado para lutar em Toulon, como subalterno, mas ele não concordava com a estratégia proposta por seus superiores. Ele mesmo sugeriu um novo plano, fazendo uso de canhões, colocando em prática seu conhecimento em artilharia. Ele teve autorização para agir e saiu vitorioso, expulsando os ingleses da cidade.
Com esse sucesso, ele foi promovido a brigadeiro-general, aos 24 anos. Pôde então tirar sua família da pobreza em Marselha, e comprou uma bela casa para sua mãe.
Termidor
Em julho de 1794, no mês Termidor do Calendário Revolucionário, o Terror atingia seu ápice, mas um grupo de Convencionais (pertencentes à Convenção), enojados com a carnificina, decidiram tirar o tirano Maximilien Robespierre do poder.
Para isso eles aproveitaram um erro do ditador e o acusaram de estar conspirando contra a Revolução. Assim os irmãos Robespierre, Maximilien e Augustin, foram executados na guilhotina, a qual foi aposentada a partir de então.
Napoleão chegou a ser preso nessa ocasião, por ter se tornado próximo a Augustin Robespierre, mas como apresentou uma boa defesa, mostrando que durante toda a sua vida militar havia lutado pela Revolução, foi liberado em seguida.
O grupo de Convencionais que derrubaram Robespierre, era liderado, entre outros membros, por Paul Barras, também oriundo da nobreza, e que viria a ter papel importante na vida de Napoleão.
O Conselho dos Quinhentos, o 13o Vindemiário e o Diretório
Com o fim do uso da guilhotina a Convenção se viu incapaz de governar. Para evitar os excessos cometidos pelo antigo Comitê de Segurança Pública, foram criados dois poderes, o Legislativo e o Executivo.
O poder Legislativo era formado pelo Conselho dos Quinhentos, e o poder Executivo era composto por cinco diretores. Eles redigiram uma nova Constituição, que não agradou a todos.
Logo alguns grupos de anarquistas, extremistas e monarquistas começaram em Paris as revoltas contra os constitucionalistas.
Em outubro de 1795, mês Vindemiário do Calendário Revolucionário, o povo foi chamado por esses grupos para levantar armas contra a Convenção. Paul Barras, líder dos constitucionalistas, convidou Napoleão para lutar sob suas ordens. Presando pelos princípios da Revolução, defendidos pela Constituição, que por sua vez era defendida pela Convenção, Napoleão aceitou a proposta de Barras.
Só que os revoltosos estavam em maioria. Novamente Napoleão recomendou o uso de canhões e com eles o grupo conseguiu conter a rebelião e "salvar a revolução".
Em 1795, no 13o Vindemiário, a Convenção deixou de existir e foi substituída de vez pelo Diretório. O constitucionalista Barras foi nomeado um dos diretores e Napoleão foi promovido a general e assumiu o comando do Exército do Interior.
Sobre as vitórias de Napoleão
em Toulon e no Vindemiário em Paris, o autor do livro faz uma interessante reflexão: Por que
ele fracassou em Ajaccio e saiu vitorioso nessas duas batalhas? E a resposta está
na habilidade técnica que ele apresentou nesses dois eventos na França.
Enquanto
na Córsega ele era apenas mais um oficial, um ardente patriota, na França ele
era um especialista. Com sua habilidade em artilharia ele atendeu a uma
necessidade específica e dominou a situação.
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Joséphine
Proveniente de uma família de nobres franceses que se estabeleceram na ilha de Martinica para produzir açúcar, a jovem Rose Tascher teve uma vida boa e tranquila até a adolescência.
Casou-se na França aos 16 anos, por arranjo das famílias, com o jovem visconde Alexandre de Beauhanais. Ela era apaixonada por ele, mas ele tinha não conseguia se manter fiel. Eles tiveram dois filhos, uma menina e um garoto, mas logo se divorciaram.
Durante a fase do Terror da Revolução, por pertencerem à nobreza, os dois foram para a prisão. Alexandre chegou a ser guilhotinado mas Rose foi libertada logo após a morte de Robespierre.
Depois de ter passado muitos momentos difíceis e trágicos, ela procurou ter uma vida mais "leve", meio fútil e hedonista até. Teve alguns relacionamentos, entre eles com o promissor Paul Barras, que a protegeu por um tempo.
Foi nessa época que ela conheceu Napoleão, que já começava a se destacar. Ele já havia se interessado por uma moça antes, Desiré Clary, (já falamos desse romance na postagem do filme Desirée - O Grande Amor de Napoleão).
Mas quando Napoleão conheceu Rose, ele com 26 anos e ela com 32, ele se apaixonou perdidamente por ela, que, por sua vez, o achou interessante, mas nunca se apaixonou verdadeiramente por ele. Ainda assim eles começaram um relacionamento e logo se casaram, em março de 1796. Foi ele que passou a chama-la de Joséphine.
Campanha Italiana
Depois da vitória do Vindemiário o objetivo de Napoleão era combater os inimigos da França: Áustria e Piemonte, no norte da Itália, liderando o Exército dos Alpes.
Ele pediu o cargo ao diretor Paul Barras, que recusou a princípio, mas, vislumbrando futuros interesses de parcerias, com a "estabilidade" gerada pelo casamento de Napoleão com Josephine (ambos pertencentes à nobreza, assim como Barras), o diretor acabou acatando o pedido, como presente de casamento.
Assim, em 1796, dois dias após seu casamento, Napoleão seguiu para Nice, onde montou seu quartel-general. Porém, ele encontrou seu exército em "assustadora penúria", magros, vestindo uniformes gastos e que não seguiam padrão algum, alguns até sem os sapatos, e completamente mal equipados.